1 de mai. de 2009

Texto coletivo

A leitura impactante do capítulo Espaço/Tempo de Z. Bauman, em Modernidade Líquida , livro de sua autoria e publicado pela Jorge Zahar Editor, em 2001 serve de cenário para este texto coletivo.

A passagem da Modernidade Sólida para a Modernidade Líquida é da medida do volume e da consistência das nossas idéias e da possibilidade de cada um de se esgueirar por essa viela apertada, sinuosa

Exige que deixemos para trás o que pode nos comprometer nessa travessia, o que nos segura ao passado e perder o medo do futuro. O instante da passagem é o momento do nascimento de um novo tempo e espaço que viveremos do outro lado.Temos de correr riscos e nos despojar do que é seguro(?) e avançar , apesar de desconhecermos o caminho.

Instigamte para quem vive para a educação, na educação e quer carregá-la para além de seus limites espaço-temporais.


O homem constrói e vive a história do tempo. Sua necessidade de compreender e controlar o tempo desde sempre o acompanhou. No Antigo Egito, o estudo do tempo fazia-se necessário à sobrevivência. As estações do ano, por exemplo, foram constituídas como meio do homem se precaver das enchentes – que aniquilavam aldeias inteiras – ou ainda para definir épocas de plantio.

Uma nova concepção temporal surge com a Revolução Industrial, na qual o homem é produtor de ferramentas. Nessa condição o tempo torna-se sinônimo de dinheiro, é o tempo do “trabalho produtivo”. Com o surgimento das máquinas a vapor e dos aviões constitui-se o tempo do hardware. Os assim chamados hardware permitem ao homem “manipular” o tempo e consequentemente “manipular” o espaço. "O movimento acelerado significava maior espaço, e acelerar o movimento era o único meio de ampliar o espaço". A maneira como entendemos e lidamos com o tempo determina a forma como vivemos, nos relacionamos e nos organizamos enquanto sociedade.

Vivemos um tempo onde as pessoas constroem “templos do consumo” constituídos como lugares em que se possa pertencer a algo, sem necessariamente fazê-lo.

Assim, aquele que busca o consumo nesses espaços projetados para tal fim (Shopping Center, por exemplo) está, de certo modo, buscando pertencer a um lugar que seja um ‘não-lugar’. Algo fora da realidade cotidiana, que o remeta à busca de uma identidade, na semelhança com os demais que ali habitam, mas que não lhes permitem uma total interação, uma criação de vínculos, pois o consumo é algo estritamente pessoal.

Nesse mundo competitivo e imediato em que vivemos, a discrepância é clara entre a necessidade do outro, vivida por cada indivíduo e o receio de se construir laços com o próximo, em uma realidade modificada pelo permanente movimento do mundo.

Nos corredores de um shopping center, tem-se a impressão de que todos estão ali motivados pelo mesmo fim, em uma ilusória sensação de vida de comunidade. E também é o espaço onde se encontram os estranhos e as diferenças, que podem ser negadas ou devoradas, mas que não podem incomodar, tirar do lugar seguro.

Não fale com estranhos!

Será que a partir dessa afirmativa nos cabe perguntar: O estranho que vemos no “outro” será o estranho que não conseguimos ver / reconhecer em nós?

Dentro desse tempo / espaço líquido que vivemos, perdemos a capacidade de conviver com a diferença, sem falar na capacidade de se relacionar com o outro, que não se adquire e não se faz sozinha. Essa capacidade é uma arte que requer estudo e exercício. Capacidade esta que nos leva a entender a condição humana de seres plurais que não nascem prontos.

Lembrando Levi Strauss ao falar sobre o Cru (Natureza) e o Cozido (Cultura), as nossas relações humanas estão “cruas”, faltando ainda muito para se chegar ao “cozido”. Tornando líquidas relações sólidas de estranhamento em um mundo volátil.

Nisso também está a imagem mental que cada pessoa tem do seu ‘mundo particular’. Cada qual tem um ‘mapa’ de sua realidade, segundo o seu conhecimento e suas experiências vividas. Daí também se dá a existência de espaços vazios. Não apenas vazios de significado, mas vazios da necessidade da presença do outro, da obrigação com o próximo e da interação.

Em relação ao tempo / espaço, percebe-se a rapidez das informações, a instabilidade constante, os sujeitos em busca de adaptação aos interesses do momento.

É tudo, portanto, muito rápido, muito passageiro. As relações, os objetos... nada precisa durar. E, numa época nunca vista ou vivida, segundo o autor, “não-mapeada”, o que surge e desaparece imprime às pessoas um tom de modernidade, de atualização. Os filhos que são mais parecidos com o tempo em que vivem do que com seus pais.

No mundo software, tal como no mundo hardware, continuam existindo os que mandam e os que obedecem. Os que mandam são os que conseguem manter suas ações livres, sem normas e, portanto, imprevisíveis. São pessoas que se movem e agem com maior rapidez. Os que obedecem são os que não podem se mover tão rápido. São impedidos de deixar seus lugares quando querem.

Na contemporaneidade, tem poder quem detém, por alguns “momentos”, aquilo que é etéreo, “líquido”. Outrora, o poder era dos donos das fazendas, do maior número de escravos, da maior mansão, da maior indústria. A vida de hoje, porém, habita um flat. A roupa de cama usada na noite anterior, no fim do dia, não está mais lá. Foi trocada. O lixo? Desapareceu como mágica dos cestos. Isso é poder. Isso não mais depende de dinheiro.

Freio é preciso, mas não na instantaneidade, pois ela é a nossa realidade e faz parte do nosso tempo de experimentar. Há que se por freio na falta do pensar e do refletir. Que impactos – sociais, ambientais e econômicos – causamos com esse modus operandi? Voltar no tempo é discutível. Viveríamos sem anestesia, vacinas, internet, camisinha? Porém, sem freio, viveremos sem ar, água potável, paz entre os povos, biodiversidade, vida digna?

No contexto educacional, podemos afirmar que a escola está atenta aos movimentos e educa para a modernidade líquida? Continuar na estrutura sólida é uma opção consciente da escola ou a mesma assim permanece porque se encontra numa situação de conforto?

Se na escola estranhos se encontram, estes estabelecem modos de enfrentar a alteridade. Em todos os lugares, esta tarefa de encontrar estranhos requer habilidades da civilidade além dos limites espaço-temporais.

O que seria a civilidade? Bauman nos indica a metáfora das máscaras que permitem a interação em torno de interesses comuns. Assim, no engajamento em vestir uma máscara pública, nos termos da civilidade, objetivamos proteger os outros de serem sobrecarregados com o nosso peso.

Todavia, alguns espaços públicos esvaziam a nossa civilidade, a exemplo das praças modernas (lugares de passagem) e dos espaços de consumo (lugares de sedução).

Cabe a nós perguntar: quais espaços de civilidade nos restam ? A escola é um espaço de civilidade?